Em artigo levado às páginas de vários jornais, neste domingo (6), Fernando Henrique Cardoso fala de drogas.
Nada a ver com os panetones tóxicos de Brasília, nocivos à democracia e às arcas da Viúva. Ele discorre sobre drogas que roem a saúde –mmaconha, heroína, crack...
Anota que fracassou a tática da “guerra às drogas”, que a ONU, empurrada pelos EUA, disseminou pelo mundo faz dez anos.
Escora-se em estudos da própria ONU e de comissões independentes constituídas na Europa e na América Latina.
Uma delas, a Comissão Latino-Americna, copresidida pelo próprio FHC, junto com os ex-presidentes da Colômbia, César Gaviria; e do México, Ernesto Zedillo.
Concluíram: “Estamos perdendo a guerra contra as drogas e, a continuarmos com a mesma estratégia...”
“...Conseguiremos apenas deslocar campos de cultivos e sedes de cartéis de umas a outras regiões, sem redução da violência e da corrupção que a indústria da droga produz”.
FHC lembra que, “no Brasil, não há produção de drogas em grande escala, exceto maconha”. No mais, o abastecimento vem do exterior.
“O país tornou-se um grande mercado consumidor, alimentado principalmente pelas classes de renda média e alta”.
O que fazer? FHC repisa a polêmica idéia de “descriminalizar o consumo, deixando o usuário livre da prisão”.
Acha essencial que se reconheça: “Se há droga no morro e nos mocós das cidades, o comércio rentável da droga é obtido no asfalto”.
Anota: “É o consumo das classes médias e altas que fornece o dinheiro para o crime e a corrupção. Somos todos responsáveis”.
Fala da conveniência de “abrir o jogo”, a exemplo do quie foi feito com a aids e com o tabaco, uma droga lícita.
Campanhas na TV? Não. Considera mais útil levar às drogas à conversa cotidiana nas famílias, ao trabalho e às escolas.
O grande mérito do artigo de FHC está no reconhecimento do óbvio: vende-se droga no Brasil porque há quem a consuma.
Vende-se muita droga no Brasil porque há quem a consuma em grandes quantidades.
Dito de outro modo: O tráfico só se desenvolve no país porque existe um crescente mercado para as drogas.
Um mercado tonificado pelo consumo de elite. Ou, para usar as palavras de FHC, um “consumo das classes médias e altas”.
Pois vem. O que mais incomoda na idéia da desriminalização é o fato de que ela embute um quê de discriminação.
Livra-se da cana dura o grande nariz, rico e bem nutrido. E mantém-se ao alcance da lei o menino pobre que, aliciado pelo traficante, entra no jogo como “avião”.
De resto, a proposta pode passar uma mensagem de sinais trocados: deseja-se combater o tráfico, mas tolera-se a droga.
Vai-se continuar falando de Fernandinho Beira-Mar. Mas crescerá a barreira de silêncio em torno do grande nariz.
Um nariz que não está na favela do Rio nem na periferia de São Paulo. Trafega em ambientes mais sofisticados:
Coxias de shows, camarins de desfiles, corredores do Congresso, redações de jornal...
Nas festas onde há drogas, entre uma cafungada e outra, ternos Armani e decotes Versace se dizem chocados com o noticiário sobre as atrocidades do morro.
Não será fácil convencer o país de que o combate ao narcotráfico será mais eficaz a partir da mera descriminalização do nariz endinheirado e invisível.
Admita-se que a cadeia pode não ser o lugar mais adequado para o grande nariz. Mas ignorar o seu papel de cúmplice tampouco parece adequado.
É preciso puni-lo de alguma maneira, ainda que por meio de penas alternativas. De resto, o Estado precisa prover ao usuário de drogas tratamento de saúde adequado.
- Serviço: Pressionando aqui, você chega à íntegra do artigo de FHC.
Escrito por Josias de Souza às 19h26
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