Numa entrevista ao Blog do Boleiro, do Portal Terra, publicada pelo "O Globo", de 21 deste mês, o técnico Dunga extravasou seu desconforto, seu rancor e sua mágoa com as incríveis derrotas para a Venezuela e o Paraguai e o empate com a Argentina em Belo Horizonte. O empate com a Argentina não chega a surpreender ou revoltar, mas a decepção da torcida brasileira vem da forma como a seleção jogou.
Atuação horrível, gelada, sem amor pela camisa, portanto sem emoção. Três partidas seguidas, nenhum gol, nenhuma vitória. O treinador, homem de temperamento difícil, como se constata por suas próprias palavras, não vem conseguindo ao longo do tempo acertar um sistema tático e técnico ao nível de nosso futebol, tão mágico quanto lógico, de forte vocação ofensiva.
Ele arma basicamente com quatro, às vezes cinco homens no meio do campo, mesmo estilo de Carlos Alberto Parreira. Nas ações ofensivas, quando a equipe é atacada, vá lá. Tudo bem. Mas quando tem que partir para frente é um desastre. Porque falta espaço. O time acaba marcando a si mesmo, além de deixar um campo mais aberto do que o normal entre o meio e a linha de zagueiros. Aliás, como aconteceu em 2006.
Congestionando a meia cancha, a seleção termina também bloqueando os lançamentos a distância e dificultando os avanços dos laterais que, no futebol moderno, são tanto zagueiros quanto extremas avançados. Aliás, diga-se de passagem, estas duas posições foram as que mais se modificaram nos últimos anos. Para exercer tais funções, na realidade duplas, a exigência de preparo atlético é gigantesca.
Porém é indispensável haver espaço para isso. Se o time embola na frente, as alternativas passam a ser muito menores. Para quem é tecnicamente superior, caso do Brasil, quanto mais espaço melhor. E quanto menos pior. Os adversários agradecem o sistema de automarcação. Mas este é outro caso.
O fato essencial é que, com base no que ele próprio afirmou na entrevista ao Portal Terra, Dunga não se sente mais à vontade no posto e se encontra às véspera de passar o comando. Inclusive, no fundo, demonstrou obliquamente que não tem apreço maior pela posição que ocupa. Quando a pessoa começa a dizer que vive bem, não precisa do emprego, é porque na verdade não está suportando o peso da cobrança e da responsabilidade. Isso, inclusive ocorreu com João Saldanha em 70.
A derrota para a Argentina em Porto Alegre, por dois a zero, o empate com o Bangu por um a um, seu desentendimento com Pelé, sua briga com Yustrich, então treinador do Flamengo, formaram um lenço de pretextos e motivos para que saísse. Agora com Dunga o ambiente não é tão crítico como aquele que psicologicamente envolveu Saldanha, mas quando o panorama se torna sombrio e a atmosfera pesada, é natural perguntar-se quem será o substituto na margem do campo ou na boca do túnel que, no fundo, é uma passagem da tática para a emoção e para o delírio. Quando esta emoção falta, falta tudo.
Isso de um lado. De outro, a intervenção do presidente da CBF, Ricardo Teixeira, assumindo a iniciativa de convocar Ronaldinho Gaúcho, não incluído por Dunga no escrete, deixa clara a tendência de escolher um novo técnico. Pois, francamente, não é atribuição do dirigente da Confederação convocar jogadores. Se assim fosse, ele teria a atribuição de escalar o time. E isso não faz sentido. Não faz sentido tampouco Dunga dizer, como está em "O Globo", que, apenas, no caso, Ricardo Teixeira resolveu falar com Ronaldinho Gaúcho.
Ora, quem deveria ter falado, se fosse sua vontade, era ele próprio. Uma coisa é a presidência da CBF. Outra a armação da equipe. Teixeira não é técnico de futebol. Ao tomar tal iniciativa, politicamente, procurou, isso sim, eximir-se da responsabilidade pelos seguidos insucessos. Como na antiga piada atribuída a um treinador: eu venci, nós empatamos, vocês perderam.
Há momentos no universo fantástico do futebol em que os técnicos esgotam suas missões. Não é fácil ser treinador. Se nos clubes a tarefa já é enorme, que dirá à frente da seleção Brasileira? Sobretudo porque o mais fascinante esporte inventado em toda a história é marcado tanto pelo amor quanto pela paixão. O técnico oscila sempre entre o êxito e o fracasso, entre a consagração e o desabamento.
Talvez por sentir-se atingido por uma onda de rejeição, Dunga tenha partido para culpar os jornais e a rede Globo. É sempre assim. Mas não foi a imprensa quem escalou a equipe. Não foram os jornalistas que traçaram o perfil tático da Seleção de Ouro. A imprensa não criou nada.
Mas refletiu tudo como um espelho da realidade. Este é o destino dos jornais. Que não se confunde com o do treinador.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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