domingo, 17 de agosto de 2014



Cortejo fúnebre de Eduardo Campos chega ao Cemitério de Santo Amaro, no Recife

Por iG São Paulo | - Atualizada às

Candidato do PSB será enterrado ao lado do avô Miguel Arraes. Ruas próximas ao local ficaram tomadas pelo povo

Após um trajeto de dois quilômetros de ruas lotadas pela população, o caixão com os restos mortais de Eduardo Campos chegou ao Cemitério de Santo Amaro, onde outra multidão de admiradores aguardavam a chegada do cortejo fúnebre. Familiares acompanharam o caixão do caminhão do Corpo de Bombeiros.
José, de 9 anos, abraça caixão do pai Eduardo Campos (17/8). Foto: Paulo Whitaker/Reuters

Distância foi percorrida lentamente em meio ao público que desde cedo tomou as ruas do Recife. Estima-se que 130 mil pessoas participaram do velório de Eduardo Campos. Outras 30 mil ainda estavam na fila quando o período de visitação foi encerrado. 

Leia mais: Multidão escala túmulos para acompanhar enterro de Eduardo Campos 

Os corpos de Eduardo Campos e dois assessores, Carlos Percol e Alexandre Severo, chegaram ao velório às 2h deste domingo (17). Durante a manhã, uma missa de corpo presente, de quase duas horas, foi celebrada pelo arcebispo de Recife e Olinda, dom Fernando Saburido. 

O adeus: Pernambucanos se despedem de Eduardo Campos no Recife
Acidente aéreo: Morre Eduardo Campos, candidato do PSB à Presidência

Além de milhares de admiradores do ex-governador de Pernambuco, passaram pelo local os presidenciáveis Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), o ex-presidente Lula, e candidatos ao governo de São Paulo, como Geraldo Alckmin e Alexandre Padilha. Durante quase todo o velório, que durou até as 16h30, a vice da chapa de Campos e provável candidata à presidência pelo PSB, Marina Silva, esteve ao lado do caixão e da viúva Renata Campos e de seus cinco filhos.

Contexto político: Marina terá de assinar carta preparada pelo PSB para candidatura à Presidência
Eduardo Campos e seis assessores da sua campanha à presidência morreram na queda de jatinho em que viajavam na última quarta-feira (13) em Santos, litoral paulista.
Leia tudo sobre: eleições 2014morte de camposeduardo campospsb


sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Marina Silva pode decidir a eleição

Se a ex-senadora não assumir a vaga de Eduardo Campos, joga a reeleição no colo de Dilma Rousseff. Se assumir a vaga, transforma o próximo pleito num dos mais disputados dos últimos tempos

ALINE RIBEIRO E ALBERTO BOMBIG
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Capa home - edição 846 (Foto: reprodução)
>> Trecho da reportagem de capa de ÉPOCA desta semana:
Na manhã da quarta-feira, dia 13, quatro integrantes da Rede Sustentabilidade se reuniam – com a TV ligada – no apartamento de Marina Silva, em São Paulo. Discutiam-se os rumos da campanha – sem saber que eles, os rumos, mudariam radicalmente em instantes. O noticiário da televisão dava conta de um desastre aéreo em Santos. Apreensão. Era lá que o candidato do PSB, Eduardo Campos, pousaria naquela manhã para um compromisso de campanha. A televisão anunciou que era um acidente de helicóptero. Alívio. Campos e sua comitiva estavam num jatinho. Segundos mais tarde, a correção. Era mesmo um avião. Apreensão. Que logo se transformou em desespero, quando, por volta das 12h30, confirmou-se que se tratava do modelo Cessna Citation 560 usado por Eduardo e sua comitiva de sete pessoas. Terminava em tragédia o sonho de um dos mais promissores políticos brasileiros. Inconformada, Marina chorou. Chorou muito. Baixou então a cabeça e, concentrada num profundo silêncio, rezou por alguns minutos. Só aí murmurou algumas palavras: “Não pode ser verdade, isso não pode ter acontecido”.
Mas aconteceu – e, nos próximos dias, Marina fará uma escolha que afetará todos os brasileiros. Antes de o Cessna cair em Santos, havia dúvidas sobre se a presidente Dilma Rousseff seria reeleita no primeiro turno ou se teria de disputar um segundo, provavelmente contra o tucano Aécio Neves. Agora, tudo muda. Se Marina decidir não concorrer, joga a eleição no colo de Dilma, em primeiro turno. Por um motivo simples. Sua coligação não tem nenhum outro candidato capaz de conseguir uma votação expressiva. E, se Marina decidir concorrer – mais provável –, ela tem tudo para embolar a eleição.
Logo depois de saber da morte de Eduardo Campos, o economista Murilo Hidalgo, dono do instituto Paraná Pesquisas, foi a campo fazer um levantamento telefônico com o nome de Marina no lugar de Eduardo. O resultado dá uma dimensão do tamanho da reviravolta que ela pode provocar. Como o levantamento não foi registrado, a Justiça Eleitoral proíbe a divulgação de seus resultados. Eles servem, porém, para balizar o impacto do ingresso de Marina na disputa pelo Planalto. As respostas obtidas pelo Paraná Pesquisas sugerem que haverá segundo turno se Marina entrar. A soma das intenções de voto em Marina e no tucano Aécio Neves é largamente superior ao total obtido pela presidente Dilma Rousseff. Mais: os números tabulados sugerem que Marina entra no jogo em patamares próximos aos que tinha em abril, quando estava na segunda colocação da disputa eleitoral. Tanto a distância dela para Dilma quanto para Aécio ficam dentro da margem de erro desse levantamento. Marina chegaria a esse nível capturando o eleitorado fiel a Eduardo Campos, arregimentando parte do eleitorado até agora contado entre os indecisos e, em menor grau, roubando um quinhão dos votos de Dilma.
Autor: REVISTA ÉPOCA Fonte: REVISTA ÉPOCA

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Marina não é escolha automática do PSB, diz professor

Lançar candidatura da ex-senadora seria a atitude mais racional, mas deve render muitas negociações dentro do partido, segundo Roberto Romano, professor Unicamp

REUTERS/Ueslei Marcelino
Marina Silva e Eduardo Campos em material de campanha
Marina Silva e Eduardo Campos em material de campanha: futuro do PSB ainda é incerto
São Paulo – Dez dias é o prazo que a coligação liderada pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro) tem para definir o nome de quem assumirá o posto de Eduardo Campos na corrida eleitoral pelo Planalto. O candidato morreu na manhã desta quarta-feira em um acidente de aéreo.
Marina Silva, candidata à vice na chapa, é o nome mais óbvio. No entanto, segundo Roberto Romano, professor de Filosofia Política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a ex-senadora não é unanimidade dentro do partido de Campos. “O lançamento da candidatura dela será produto de muita negociação interna”, afirma.
Apesar de não ser automática, a escolha pela ex-senadora seria a opção mais racional para o partido. Marina foi a principal revelação das eleições presidenciais de 2010. Pelo Partido Verde (PV), do qual fazia parte na época, ela abocanhou 19,2% dos votos no primeiro turno – o que representa 20 milhões de eleitores.
O desempenho diante do eleitorado não seria a única questão.“Se a candidatura de Marina for lançada, questiona-se até que ponto ela continuaria com a paz interna com o PSB dada a diversidade de culturas. Se lançar outro nome, certamente o partido continuará pequeno", afirma o professor. Confira trechos da entrevista que ele concedeu à EXAME.com:
EXAME.com: A Marina Silva é, realmente, a candidata natural do PSB neste momento?
Roberto Romano:
Certamente ela é a candidata que mais pode amealhar votos para o PSB e aliados, só que isso não quer dizer que ela seja automaticamente candidata à presidente.

Depois que o Rede Solidariedade não conseguiu concorrer às eleições, a Marina Silva foi recebida pelo PSB justamente para potencializar a candidatura de Campos. Ela não é velha militante do partido e não é unanimidade.
Mas é a candidata mais racional, a que renderia o maior contingente de votos. O lançamento da candidatura dela será produto de muita negociação interna.
EXAME.com: Se não for ela, quem poderia ser lançado candidato neste momento?
Roberto Romano:
Como em quase todos os partidos políticos, o PSB não tem nomes que atraiam multidões. A Luisa Erundina é conhecida, mas não é unanimidade dentro do partido. O Cristóvão Buarque é pernambucano e tem um eleitorado em Goiás e Distrito Federal, mas não tem, por enquanto, a dimensão de liderança que o Campos tinha.

O que mais me deixa preocupado é que a candidatura do Eduardo trazia uma oxigenação ao ambiente político brasileiro. Ele não era a grande solução, mas a novidade estava na pluralidade que ele representava. Estamos há 20 anos na bipolaridade entre PT e PSDB. Passado o luto, a guerra entre tucanos e petistas vai voltar.
EXAME.com: A Marina tem condições de assumir este papel - como ela fez em 2010?
Roberto Romano:
Como a formação de Marina e do PSB, às vezes, são antagônicas, é muito difícil. Tanto do ponto de vista programático, quanto do ponto de vista prático. 

Em 2010, ela conseguiu muito apoio porque não estava dentro de um partido político tradicional. Mesmo assim, ela já teve dificuldade para arrecadar fundos. Agora, com o Aécio tendo o apoio maciço do empresariado, ela vai ter muita dificuldade.
EXAME.com: Muitos têm falado que, internamente, a união do PSB com o Rede, de Marina, seria parecida com a fusão de duas empresas com culturas diferentes. O senhor concorda?
Roberto Romano:
O Rede surgiu de um movimento posterior ao socialismo e tem o traço muito forte de luta pela ecologia, contra a corrosão da natureza pelo desenvolvimento industrial. Já o PSB é o socialista democrático clássico. Para um partido assim, é muito difícil incluir estes elementos.

EXAME.com: Qual deve ser o tom das negociações daqui para frente? O que está em jogo?
Roberto Romano:
O PSB só tinha a ganhar com esta eleição. Mesmo que fosse derrotado, sairia fortalecido e poderia deixar de ser pequeno. Se a candidatura de Marina for lançada, questiona-se até que ponto ela continuaria com a paz interna com o PSB dada a diversidade de culturas. Se lançarem com outro nome, certamente vão continuar pequenos.

Trocar a roda com a caminhonete andando é muito difícil. O tempo é um elemento essencial da política: você gasta tempo para ganhá-lo. O PSB não tem tempo para gastar. Ele foi tolhido pela tragédia. 

7 vídeos que mostram um lado mais pessoal de Eduardo Campos

Ex-governador de Pernambuco e presidenciável pelo PSB morreu hoje, em acidente com avião em Santos (SP). Relembre alguns momentos de Campos fora da política

Eduardo Campos
Divulgação/PSB
São Paulo - Eduardo Campos, que disputava as eleições de 2014 pelo PSB, morreu hoje em um acidente de avião em Santos (SP).
A página oficial de Eduardo Campos no Facebook mudou sua "cover" (foto ao fundo) para uma tela preta, em luto pelo ex-candidato.
Vários políticos lamentaram a morte do candidato, incluindo sua parceira de campanha, Marina Silva. A presidente Dilma Rousseff decretou luto de três dias.
Veja a seguir alguns momentos de Eduardo Campos que não estão relacionados com sua carreira política e mostram um lado mais pessoal do ex-governador de Pernambuco.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

CPIs fizeram do Congresso puxadinho do STF
(Josias de Souza)

Divulgação
A política é uma sucessão de poses. O político começa a fazer pose defronte do espelho, ao escovar os dentes de manhã. E só para na hora de se enfiar sob os cobertores, à noite. Tome-se o caso do presidente do Congresso. No momento, Renan põe seus melhores ternos, suas mais elegantes gravatas e suas melhores virtudes para demonstrar que não se considera o Calheiros que todos conhecem, mas um reles subordinado das togas do STF.
Renan tem sobre a mesa quatro pedidos de CPI. Duas só do Senado. Duas mistas, incluindo a Câmara. Duas só da Petrobras. Duas mais amplas, misturando a Petrobras com o metrô de São Paulo e o porto pernambucano de Suape, temas que incomodam a oposição. Com poderes para optar por qualquer uma, Renan decidiu não decidir. Pose.
Oposição e governo foram bater na porta do STF. Renan achou ótimo. Pose. Acionada, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado passou o trator sobre a minoria, aprovando a CPI ampliada. Renan aplaudiu. Disse que o melhor é investigar tudo. Pose.
Os líderes partidários informaram que preferem a CPI mista em vez da comissão exclusiva do Senado. Renan assentiu gostosamente. Pose. Na semana passada, ele prometera encerrar a novela na noite desta terça-feira. Pose.
Velho crítico da judicialização da política, Renan agora prega a submissão do Congresso Nacional à deliberação do Supremo Tribunal Federal. “O importante, primeiro, é que nós tenhamos a decisão do Supremo sobre o que é que podemos fazer em relação à criação de comissões parlamentares de inquérito quando há vários requerimentos. A prudência recomenda que nós esperemos”, disse Renan. Pose.
Renan atribui o impasse ao ineditismo do enredo. O Congresso jamais lidara com pedidos similares de CPIs, ele alega. Pose. Antes mesmo da deliberação do STF, Renan aventa a hipótese de o Congresso aprovar um projeto capaz de disciplinar os surtos investigatórios dos congressistas. Pose.
A plateia, em sua densa ingenuidade, talvez não imagine como Renan precisa de poses nesse instante. Articulador de patrióticas nomeações na Petrobras, cada movimento, cada frase, cada olhar de Renan é uma pose. Juntas, elas compõem um quadro plástico.
Todo mundo sabe que o Renan dos últimos dias é uma representação do velho Calheiros de sempre. Mas em vez de transformar cada discurso num comício, os incomodados, Aécio Neves à frente, preferem visitar a ministra Rosa Weber, do STF. Rogam-lhe que obrigue o Parlamento a fazer por pressão o que não é capaz de fazer por obrigação. Poses coletivas.
O Congresso virou um teatro. Se Dante fosse deputado ou senador no Brasil de hoje, estaria dispensado de fazer a Divina Comédia. Bastaria que protocolasse no STF um mandado de segurança. E Dante viraria um escritor por liminar. Em Brasília, a comédia já vem pronta. É 100% feita de poses.

terça-feira, 15 de abril de 2014

Como ser enganado supondo-se informado

Por Mauro Malin em 15/04/2014 na edição 794             
       
              

Martin Vandenberg, personagem de Amós Oz em Entre amigos, folheia um jornal onde só encontra “barbaridade e feiura e uma dose maciça de lavagem cerebral”. Descontadas a propensão a um radicalismo ingênuo de Vanderberg, e as décadas passadas desde a época de ambientação do livro, nós, os alvos da lavagem cerebral, somos mais enganados pelo que lemos (e mais ainda pelo que não lemos) do que gostaríamos de admitir.
Eis alguns exemplos. São quase bem-comportados, perto de coisas que não saem nos jornais, embora cheguem ao conhecimento das redações. Não lhes diminuo a eventual gravidade, mas vejo com certa ironia tantos pontos de exclamação de personagens do teatro político e leitores indignados. É como se, berrando por causa desses fatos conhecidos, abafassem o ruído de outros, mais pressentidos ou intuídos do que propriamente conhecidos. Mas não desconhecidos, porque, com destaque muito menor, também saem em letra de forma.
1. Por que em nenhum momento os paulistas foram avisados de que caminhavam para a iminência de um colapso do fornecimento de água? Ou melhor: houve avisos dados por técnicos e especialistas, mas eles não tiveram a divulgação necessária a uma tomada de consciência e a um questionamento das políticas adotadas pelo governo do estado.
2. Por que se constata agora uma distância tão grande entre o planejamento dos transportes metropolitanos no país e as necessidades reais da população? Melhor dito: entre a execução de políticas públicas da chamada mobilidade urbana e a demanda real. Em quantos anos está atrasada a construção do metrô de Salvador, por exemplo? (Iniciada em 2000, a obra da primeira linha deveria ter sido concluída em 2008. O panorama não é muito diferente nas outras metrópoles: um serviço, quando existente, caro e insuficiente.)
O mantra da Siemens
Por que a mídia simplesmente repete o mantra da Siemens, usado em press-releases, segundo o qual a empresa “foi a autora da denúncia que deu origem às investigações sobre possível existência de cartel nos contratos” (Folha de S. Paulo, 12/4) no setor de trens? Fica parecendo que a Siemens, um belo dia, descobriu horrorizada que funcionários seus estavam pagando propinas para garantir negócios no Brasil e em outros países.
Não é nada disso. A Siemens, empresa com longa tradição de crimes (usou trabalho escravo judeu durante o nazismo), viu-se acossada por autoridades suíças a pôr termo à prática de corromper funcionários públicos em determinados países. Foi a origem imediata da mudança de atitude da empresa no Brasil. Entregar anéis.
Leia-se, a propósito, reportagem de Patrick Radden Keefe publicada na revista piauí (“O tesouro, o mercador, o ditador e sua amante – Como um bilionário israelense conquistou o controle de uma jazida colossal na Guiné e a dividiu com a Vale”, março de 2014; na sequência vem a reportagem de Consuelo Dieguez “Contrato de risco – Como a Vale assinou um acordo para assumir todos os custos de uma transação bilionária e obscura na Guiné”).
A raiz do fenômeno está descrita assim por Keefe:
“Muitas nações combatem acirradamente a corrupção doméstica, mas se mostram bem permissivas quanto a propinas pagas fora do país. Até pouco tempo, empresas francesas podiam declarar como despesas dedutíveis os valores que desembolsavam à guisa de suborno em negócios no exterior. Recentemente, porém, as normas internacionais começaram a mudar. O Departamento de Justiça dos Estados Unidos intensificou a observância da Lei de Práticas Corruptas no Exterior, o Reino Unido aprovou uma lei própria e igualmente severa, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico instituiu uma convenção contra o suborno, e várias dezenas de países – entre eles Israel – assinaram o acordo. Empresas de primeira linha, como a Siemens e a KBR responderam a acusações de corrupção pagando multas no valor de centenas de milhões de dólares.”
As multas pagas pela Siemens podem ter ultrapassado a barreira do bilhão de dólares. No verbete em inglês “Siemens” da Wikipedia lê-se que a empresa concordou em pagar uma multa recorde de US$ 1,34 bilhão em dezembro de 2008, após ter sido investigada por suborno pesado. A investigação encontrou pagamentos questionáveis de aproximadamente 1,3 bilhão de euros, entre 2002 e 2006, que dispararam amplo leque de inquéritos na Alemanha, nos Estados Unidos e em vários outros países.
Petróleo e lorotas
3. Por que a mídia levou oito anos para colocar em questão o negócio feito pela Petrobras na Califórnia? (Mais corretamente: para repercutir denúncias que colocaram em questão etc. Não foram jornalistas que apuraram a lambança.)
4. Por que a OGX, de Eike Batista, “levou dez meses para divulgar inviabilidade de campos” de petróleo, segundo a Comissão de Valores Mobiliários (Valor, 11-13/4), e a mídia levou outro tanto, em seguida, para contar essa história?
A lista poderia ir adiante de modo praticamente ilimitado, mas o objetivo é apenas exemplificar.
Agora, vejamos algumas respostas possíveis.
Primeiro, a dependência que os repórteres têm das autoridades. Obter um furo deixou há muito de ser um feito calcado na competência e na tenacidade do jornalista, para se tornar questão de boas relações acríticas com as fontes, ou seja, com autoridades de todo tipo. Não é preciso dizer que esse “furo” será sempre contaminado pelo beneplácito do informante. Esse tema é constante no Observatório da Imprensa desde sua criação, em abril de 1996.
Crise das empresas e redações
Entendamo-nos: o jornalismo brasileiro foi historicamente vinculado ao poder (e aos contrapoderes), mas passou por processos de renovação que corresponderam, de certa forma, a modernizações democratizantes no país. O regime do golpe de 1964 truncou esse processo, especialmente depois da decretação do AI-5, em 1968, mas na segunda metade dos anos 1970 uma parte ponderável do jornalismo se afastou do poder, até que, movido pela campanha das Diretas Já, em 1984 (usada aqui mais como marco simbólico do que com pretenso rigor científico, porque se trata de todo um processo iniciado dez anos antes), tomou partido cada vez mais claro da redemocratização.
Teve seu momento de “glória”, mas a crise estrutural das empresas jornalísticas, que coincide mais ou menos com a passagem para o século 21, foi fazendo com que assessorias de imprensa se tornassem tão ou mais poderosas do que redações. Quando se aponta a dependência em relação às autoridades, não se deve entender que o jornalista fica literalmente na antessala do poderoso esperando a migalha de informação, como já foi um dia, ou tentando obtê-la por telefone, como ainda é em grande parte, mas um complexo de práticas que inclui também a citação de “declarações oficiais” (como a da Siemens acima mencionada).
Mentiras e enganos
Acresce que as autoridades mentem. Mentir faz parte de seu desempenho esperado, embora isso esteja em contradição com a raiz etimológica da palavra autoridade.
Não só mentem. Enganam-se. Erram.
Hitler se absteve de massacrar a Força Expedicionária Britânica (BEF) durante a retirada de Dunquerque (maio-junho de 1940) porque fez uma aposta errada na prevalência política do sentimento de apaziguamento dominante entre as elites britânicas, mas acabou diante da disposição antinazista capitaneada por Churchill.
Stálin recebeu oitenta avisos sobre iminente invasão alemã (Operação Barbarossa, junho de 1941) e não quis acreditar em nenhum deles. Preferiu deixar-se guiar pela crença de que a Alemanha não atacaria e, nos marcos do acordo assinado em 1939 com Hitler, continuou mandando trens carregados de matérias-primas estratégicas, como borracha, até dias antes da agressão.    
Podemos acrescentar os seguintes fatores:
>> O Brasil não consegue se planejar, apenas acenar com programas de governo que seguem o calendário eleitoral.
>> O planejamento brasileiro parte invariavelmente da premissa de que a maioria do povo continuará sem acesso a serviços públicos, ou que se contentará com doses miserentas de cuidados, embora o voto seja hoje universal.
Uma verdade humana é que não vivemos como nos dita a consciência. Não dizemos o que pensamos. Sentimos uma coisa e fazemos outra. (V. Grossman, Vida y destino.)
Lula e regulação da mídia
Para contrariar a máxima acima, registre-se o absurdo de uma declaração do ex-presidente Lula reproduzida na Folha de S. Paulo (9/4):
“Temos que retomar com muita força essa questão da regulação dos meios de comunicação. Quando vejo o tratamento a Dilma, é de falta de respeito e de compromisso com a verdade. Não é possível que a [a mídia] não se manque que o telespectador está percebendo.”
Em regime democrático, nenhuma regulamentação da mídia vai impedir que veículos de comunicação faltem com respeito a quem quer que seja, nem vai obrigar ninguém a ter compromisso com a verdade – conceito, ademais, de difícil enquadramento administrativo ou jurídico.
Como parece ter se lembrado Lula em meio à alocução, é o destinatário da informação que vai ou não considerá-la correta. E, se a falta de respeito for considerada pelo desrespeitado como crime (calúnia, injúria, difamação), dirija-se à Justiça. Fora disso, trata-se de autoritarismo. Talvez se saiba como começa, nunca como termina.

quarta-feira, 12 de março de 2014

Qual o preço da vitória do ‘blocão’ contra o governo?


12/3/2014 15:11
Por Miguel do Rosário - do Rio de Janeiro


A oposição, aí incluindo seus tentáculos na mídia, tem o direito de comemorar a derrota política imposta pelo chamado “blocão” contra o governo nesta quarta-feira, ao criar uma comissão para investigar negócios da Petrobrás na Holanda.
É uma vitória que vale especialmente para a centro-direita (ou direita mesmo) que apóia o governo de má vontade, apenas por apego ao poder, como é o caso de parcela do PMDB e quase todo PSD, cujos membros saíram do DEM à procura de sombra e água fresca.
Entretanto, esse movimento tem dois lados.
De um lado, mostra a força do blocão, que agora tentará usar isso para ampliar as chantagens contra o governo.
De outro, revela, para o governo, quem são seus verdadeiros aliados, e quem está pronto para lhe passar a perna na primeira oportunidade.
Em ano de eleição, é muito bom saber, com certeza, quem está do seu lado de verdade.
O Congresso tem 513 deputados. O blocão conseguiu exatamente a metade do total: 257 deputados.
A turma de Eduardo Cunha assinou uma declaração de guerra. Uma guerra surda, porque entre aliados em tese, mas por isso mesmo ainda mais fratricida e sangrenta.
No Painel da Folha, há a informação de que Eduardo Cunha disse a Michel Temer que o PT tem um “projeto hegemônico que afasta aos poucos os partidos da coalização”.
Pode até ser. Mas Cunha tem um ponto-fraco. Ele confia demais em jogadas palacianas, e esquece que o poder político, seja do PT, seja do PMDB, seja do governo, seja da oposição, só tem uma fonte real: o voto.
O PMDB foi o único partido da base que perdeu filiados em 2013. Por quê? Porque não está mudando. Não está discutindo teses, programas, ideologias, projetos de país. O adversário do PMDB não é o PT, é seu próprio espelho. É um partido grande, capilarizado, que governa milhares de municípios, e que poderia contribuir muito mais para o debate político nacional se investisse mais em… debates, e menos em figuras questionáveis como Eduardo Cunha.
Afinal, o que quer o PMDB? Que o PT, ou qualquer partido que estiver no governo, lhe garanta algum tipo de cota fixa, imutável, em troca de seu apoio no Congresso?
Na verdade, o PMDB faz um jogo duplo. Ele apóia o governo, de um lado, mas surfa no antipetismo, de outro. Até aí tudo bem, é da política.
Mas haverá um momento em que o partido terá de se decidir. Essa postura de ameaçar o governo com um possível apoio a Aécio Neves apenas ridiculariza o PMDB, porque revela um partido sem substância, disposto a apoiar qualquer um, desde que lhe pague bem. Ao agir assim, as eleições se tornarão cada vez mais caras para o PMDB, porque ele terá cada vez menos o voto das pessoas politizadas, e precisarão cada vez mais do voto fisiológico, comprado a peso de ouro de um eleitor cada vez mais cético, num mercado eleitoral cada vez mais competitivo.
Tem uma senhora cujos serviços de faxina eu contrato de vez em quando que me contou uma coisa engraçada. È triste por um lado, até porque isso não deve ser legal, mas engraçado também. Os políticos lhe dão dinheiro para que ela distribua aos eleitores da região. Compra de voto descarada. O eleitor vai à casa dela, dá o número do título, e recebe R$ 50.
Aí entra a parte engraçada. Tem eleitor que vendeu seu voto para mais de cinco candidatos diferentes. Ou seja, o político, quando pensa que está enganando o eleitor, está é levando uma rasteira, merecida, do cidadão. O cidadão pega o dinheiro, evidentemente porque está precisando, mas não vota no candidato que lhe deu o recurso. Ou pode até votar num daqueles que lhe deu dinheiro, mas vota naquele de sua preferência. Ou seja, o recurso à compra de voto fica cada vez mais caro, pois o voto é secreto, protegendo o eleitor.
Voltando à “vitória” do blocão sobre o governo, tenho a impressão que muitos parlamentares que se recusaram a participar do jogo sujo de chantagem política liderado por Eduardo Cunha se identificarão com esta frase de Darcy Ribeiro, que o colega de Twitter, Mario Marona, lembrou nesta manhã, ao publicar a foto abaixo.
“Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu”.
Miguel do Rosário é jornalista, editor do blog O Cafezinho e Tijolaço.

segunda-feira, 3 de março de 2014

Da rendição (Paulo Coelho)
 

G1  

 
 


por Paulo Coelho |

seg, 03/03/14
categoria Todas
 


Um guerreiro da luz nunca se acovarda – mesmo estando diante de forças superiores.
A fuga pode ser uma excelente arte de defesa, mas nunca pode ser usada quando o medo é muito grande.
Na dúvida, o guerreiro prefere enfrentar a derrota e depois curar suas feridas – porque sabe que, se fugir, estará dando ao seu agressor um poder maior do que ele merece.
Ele sabe que pode curar o sofrimento físico, mas será eternamente perseguido por sua fraqueza espiritual. Então, mesmo diante de alguns momentos difíceis e dolorosos, o guerreiro encara a situação desvantajosa com heroísmo e coragem.
Diz Gandhi: “se eu fosse forçado a escolher entre o enfrentamento e a covardia, não hesitaria em decidir pelo enfrentamento”. Um guerreiro da luz também.
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Da injustiça



dom, 02/03/14

por Paulo Coelho |
categoria Todas



Um guerreiro da luz não olha a injustiça com indiferença. Ele é o primeiro a se levantar e a denunciar o abuso de poder e jamais se acovarda diante dos que pensam ter domínio sobre os outros.
Ele sabe que tudo é uma coisa só e que cada ação individual afeta todos os homens do planeta.
Então, quando está diante do sofrimento alheio, usa a sua espada para colocar as coisas em ordem.
Mas embora ele evite a opressão, em momento algum procura julgar o opressor.
Cada um de nós terá que responder por seus atos diante de Deus. Por isso, uma vez cumprida a sua tarefa, o guerreiro não emite qualquer comentário: segue adiante em busca de uma nova causa.
Um guerreiro da luz usa sua força com sagacidade e a usa também para vencer os combates que trava consigo mesmo. Está no mundo para ajudar seus irmãos, e não para condenar o seu próximo.
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Da entrega



sáb, 01/03/14

por Paulo Coelho |
categoria Todas



Adaptação do excelente livro de “Bahá’-U’-lláh”, líder espiritual da antiga Pérsia (1817-1892):
“Oh, meu amigo, ouve com teu coração e tua alma as canções do espírito, e tem com elas o mesmo cuidado que tens pelos teus olhos. Pois a sabedoria do céu, assim como as nuvens da primavera, não descerão sobre ti todos os dias”.
“Mesmo que a graça do Todo Poderoso continue sempre a fluir, há momentos em que uma parte dela é colocada de lado, para que tu possas compreender a suprema misericórdia. Por isso, entende que a nuvem que hoje despeja as bênçãos de primavera não ficará ali para sempre, e procura aproveitar cada gota que cai”.
“Nem todo oceano tem pérolas. Nem todo ramo floresce. Nem todo rouxinol canta com suavidade. Então, faz um esforço para ouvir com teu coração e tua alma as canções do espírito, porque elas chegam e partem”.
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Da Bíblia



sex, 28/02/14

por Paulo Coelho |
categoria Todas



Um texto do Deuteronômio:
“Quando fizeres a colheita em teu campo e nele esqueceres um feixe de espigas, não voltes para recolhê-lo. Ele é do órfão, da viúva, e do estrangeiro. Assim, o Senhor teu Deus abençoará as obras de tuas mãos.
“Quando sacudires a oliveira, aquilo que ainda ficar preso aos galhos deve permanecer lá. Ele será então para o órfão, para a viúva, e para o estrangeiro.
“Quando recolheres as uvas da tua vinha, não retornes para ver se esquecestes algumas no chão. O que sobrar é para o órfão, para a viúva, e para o estrangeiro.
“Lembra-te de que foste escravo na terra do Egito. E obedece ao que te ordeno”.
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Dos detalhes



qui, 27/02/14

por Paulo Coelho |
categoria Todas



Okakura Kazuko, escritor japonês (1863-1913), um dia reuniu seus discípulos:
“Vou ensinar-lhes uma nova maneira de entrar em contato com o Universo”, disse.  Em seguida, preparou um chá e serviu a todos. Fazia os movimentos com tanta formalidade, que fez com que seus alunos percebessem a importância dos detalhes na vida quotidiana.
Um dos rapazes, porém, reclamou da ausência de preces e meditações. Kazuko expulsou-o da aula, comentando:
“Aqueles que são incapazes de compreender o que há de grande nas pequenas coisas, terminarão sem enxergar o que há de pequeno nas grandes coisas, e serão confundidos pelo resto da vida”.
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Da predestinação



qua, 26/02/14

por Paulo Coelho |
categoria Todas



O texto é do “Livro dos Espíritos”, de Alan Kardec:
“Tudo que o homem faz não é o resultado de uma ação predestinada. Ele é freqüentemente instrumento que o Espírito usa para executar uma obra”.
“Tudo se confunde num fim geral, para onde convergem as forças que trabalham naquele sentido. Se o fim é bom, teremos a bondade. Se o fim é mau, teremos a perdição de todo um grupo, porque o mal estimula a quem está próximo”.
“Há pessoas que só vivem para elas mesmas, e não conseguem ser úteis para nada. São pobres que começam a expiar sua culpa neste próprio mundo, pelo tédio e desgosto da vida”.
“A importância de uma missão é proporcional à capacidade e elevação do Espírito”.
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Das gêmeas



ter, 25/02/14

por Paulo Coelho |
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O psicanalista Rollo May conversava com duas meninas gêmeas. À determinada altura, disse:
- Todo mundo deve comentar a semelhança entre vocês.
- Sim, disseram as meninas. – E nós detestamos isto. Seria tão bom ouvir alguém dizendo: “como elas são diferentes!”
A tarefa do ser humano é buscar a vida em sua plenitude e em sua individualidade. Não dá certo repetir fórmulas alheias, ou aceitar temores que não são nossos.
A natureza humana não é uma fábrica de produção em série, que vai colocando homens e mulheres nesta Terra. Basta olhar as árvores para constatar como são diferentes: por imensa que seja a flores­ta, cada árvore se desenvolve de acordo com suas necessidades, esforçando-se para sempre dirigir suas folhas em direção à luz.
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Da estima



seg, 24/02/14

por Paulo Coelho |
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Num belo livro, mas com um horrível título, “Canja de galinha para a alma” (Ed. Ediouro), a mãe comenta com a filha como se preparar para a vida:
“No mundo inteiro, não há ninguém como eu. Sou dona de meu corpo, dos meus pensamentos, das minhas idéias.
“Pertencem a mim as imagens que meus olhos contemplam e eu preciso saber escolhê-las. Possuo minhas próprias fantasias, meus sonhos, esperanças e medos.
“Uma vez que sou dona de mim, preciso me conhecer intimamente e possibilitar que todo o meu eu trabalhe a meu favor. Há aspectos em mim que me confundem, outros que não conheço. Mas esteja ou não de acordo com tudo o que sou, é autêntico e representa o momento em que vivo.
Tenho ferramentas para melhorar, para ser produtiva, e para organizar o que está desajustado. Sou dona de mim. Sou eu mesma e estou bem”.
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Da força



dom, 23/02/14

por Paulo Coelho |
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A jornalista Dora Kramer, analisando o conflito entre um senador e o Presidente da República, escreveu: “o uso da força, quando bem administrado, vence a inteligência”.
Tem toda razão.  Um guerreiro da luz que confia demais na sua capacidade acaba por subestimar o poder do adversário. É preciso saber que há pessoas que podem nos prejudicar – mesmo que sejamos mais capazes.
Nestes casos, agir com prudência é o mais sábio.
Uma tourada dura quinze minutos. O touro aprende rápido que está sendo enganado. Seu próximo passo é partir para cima do toureiro. Quando isto acontece, não há brilho, argumento, inteligência ou charme que possam evitar a tragédia.
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Da melodia



sáb, 22/02/14

por Paulo Coelho |
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Zaki ouviu o Xá discutir com seus amigos sobre qual seria a mais bela melodia na Terra. Uns diziam que era a que vinha da flauta, outros afirmavam que era a dos pássaros. Não chegaram a conclusão alguma.
Dias depois, Zaki convidou o Xá e seus amigos para jantar. No salão, a melhor orquestra do mundo tocou lindas canções, mas não havia comida na mesa.
Perto da meia-noite, quando todos já esta­vam mortos de fome, Zaki serviu um refinado banquete.
“Que bela canção é o tilintar de pratos e talheres”, comentou o Xá.
“Estou respondendo à sua pergunta sobre qual a mais bela melodia da Terra”, respondeu Zaki. “Pode ser a voz da amada, o tilintar de copos e pratos, a respiração de uma pessoa querida. Mas ela sempre virá do som que nosso coração precisa ouvir”.