Com grande freqüência as empresas que realizam pesquisas de intenção de voto recorrem à figura do empate técnico desejando com isso estabelecer um equilíbrio entre candidatos cujos percentuais se aproximam. É um sofisma. É também um instrumento de autodefesa dos institutos para justificar eventuais diferenças entre seus prognósticos e a verdade que surgir das urnas.
Inclusive porque as pesquisas eleitorais, como sempre destacava meu saudoso amigo Paulo Montenegro, um dos pioneiros do Ibope, quando surgiu em 1942, são as únicas que podem ser comprovadas na prática à luz de todos. Sim, porque se alguém disser que o Redoxon vende mais que o Cebion, aceita-se a informação, mas não há possibilidade de se conferir. Nas eleições, sim. É só confrontar o que os levantamentos previram e o número de votos apurados. O risco dos institutos, portanto, é muito maior. Por isso, também, é que as pesquisas eleitorais são capazes de fornecer mais credibilidade ao trabalho dos que são responsáveis por sua execução.
Os erros verificados ao longo do tempo são mínimos. Quanto ao Ibope, que sempre acompanhei desde a época em que trabalhei no antigo "Correio da Manhã" e fui um dos primeiros jornalistas a acreditar em seus números, não me lembro de mais de meia dúzia de projeções não confirmadas em 66 anos. Mas acontecem. As pesquisas não são infalíveis.
Em 92, por exemplo, o instituto falhou ao não incluir Cesar Maia no segundo turno das eleições para prefeito. Achou que o turno final seria entre Benedita da Silva e Cidinha Campos. Errou também em 85, quando FHC perdeu a prefeitura de SP para Jânio. Mas os desacertos não passaram de 0,2 por cento. Dois em mil projeções exatas. Talvez nem isso. Mas esta é outra questão. A ela estou me referindo para melhor enfocar o tema empate técnico.
Salvo estritas exceções, empate técnico não existe. Basta analisar os números. Agora mesmo o Datafolha, ao publicar na FSP de sexta-feira uma pesquisa de intenção de voto para prefeito do Rio, apontou Marcelo Crivela na frente com 24 por cento, seguido de Jandira Feghali com 16 e Eduardo Paes com 13 pontos. Daí concluiu que se registrou um empate técnico entre Jandira e Paes, já que os números de uma pesquisa podem oscilar três pontos para mais ou menos.
Isso tem que ser melhor visto. Pode ocorrer e é aceitável que tal oscilação aconteça, mas envolvendo todo o levantamento, não a posição de um candidato para outro. Por que isso? Simplesmente porque foram relacionados, além de Crivela, Jandira, Eduardo Paes, Fernando Gabeira com 7, Solange Amaral com 5, Chico Alencar com 3, Molon com 2 e Paulo Ramos também 2. São, portanto, oito os nomes. Se fosse válida uma diferença de três degraus de um em relação a outro, para mais ou para menos, teríamos 6 por cento de dúvida multiplicados por oito candidaturas.
Aceitar tal hipótese significa tacitamente imaginar como possível um potencial de erros da ordem de 48 por cento. Quase metade da própria pesquisa. Não pode ser. Mas vamos reduzir a dimensão do absurdo à metade, ou seja, 3 pontos para cada um. Nesta perspectiva, a margem de erro poderia ser de 24 pontos. Nenhuma pesquisa eleitoral, ou mercadológica, setor em que Homero Icaza Sanches sempre foi um mestre, seria válida com tal margem se não de equívoco, pelo menos de controvérsias. Não é nada disso. Em minha opinião, não existe empate técnico algum entre Jandira e Eduardo Paes. Se a primeira alcança 16 e o segundo 13 pontos, a diferença é de praticamente 20 por cento entre eles.
Onde está o empate? Empate só pode ser considerado na hipótese de diferenças mínimas. Com base no mesmo levantamento do Datafolha, pode estar ocorrendo em Salvador, onde ACM Neto está com 27 pontos e Antonio Imbassahy registra 25 por cento. Em nenhuma outra cidade das pesquisas pela empresa da "Folha de S. Paulo" se verifica algo igual. Em Belo Horizonte, por exemplo, a candidata do PC do B, Jô Moraes, surpreende com 20 por cento contra 9 de Leonardo Quintão, vindo longe em terceiro o candidato do governador Aécio Neves e do prefeito Fernando Pimentel, Marcio Lacerda, somente com 6 pontos.
Inclusive tem que se considerar as diferenças registradas entre um candidato e outro projetando-as na soma geral das intenções de voto, que assinalam as preferências de momento. Podem mudar. Mas este é outro caso. Uma diferença de 14 pontos num universo de definição, digamos de 60 por cento (no caso de 40 por cento não terem ainda sabido expressar sua vontade), em termos relativos a distância é muito maior.
Seis por cento na largada, de outro lado, é muito pouco para um candidato, ex-secretário municipal, apoiado por dois políticos extremamente bem avaliados pela população de Belo Horizonte, como é o caso de Aécio e Fernando Pimentel. A explicação só pode ser encontrada na falta de apelo maior pelo próprio candidato. Este aspecto é fundamental. Em síntese, empate técnico é uma expressão destinada a resguardar a empresa que realizou a pesquisa de uma possibilidade de erro. Por isso, só seria válida na reta de chegada, não no início da campanha.
Além disso, há uma outra questão, esta explicada pela matemática. Trata-se da lei dos grandes números. Se tendências percentualmente definidas surgem num universo pequeno, elas vão se manter no global. Lembro-me que, por sorte, evitei um equívoco no "Jornal do Brasil" nas eleições de 89. Com base nos índices de abstenção e de votos brancos e nulos por região do País, o mesmo Homero Icaza disse a Marcos Sá Correa, então editor geral, que Brizola deveria ser o segundo no primeiro turno e não Lula.
Eu disse que não. E Lula terminou com 16 pontos, superando Brizola por 1 ponto. Mesmo que o raciocínio de Homero tivesse certa lógica, o fato é que o universo de votos brancos e nulos e javascript:void(0)as abstenções por região já eram fatores absorvidos pela lei dos grandes números. Mesma coisa que pesquisa para encontrar o grau de analfabetismo. Os erros que ocorrem - é natural - se compensam entre si. Prevalece a tendência geral. É sempre assim. Se a matemática tem mistérios, este é um deles.
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