Com um século de existência, o arquiteto Oscar Niemeyer certamente já leu centenas de livros e artigos sobre sua obra. Mas o livro "Oscar Niemeyer: Curves of Irreverence", de Styliane Philippou, a ser lançado nos EUA a 2 de setembro, e o artigo "A Vision in Concrete", que Benjamin Schwartz publicou no número de julho-agosto da revista "Atlantic Monthly", oferecem também opiniões polêmicas.
Schwartz faz uma resenha do estudo de Philippou. Refere-se ainda a outros livros relativamente recentes: "When Brazil Was Modern", de Lauro Cavalcanti; "Brazil's Modern Architecture", editado por Elisabetta Andreoli e Adrian Forty; "Oscar Niemeyer: Houses", de Alan Hess; "Modernist Paradise", de Michael Webb; "Oscar Niemeyer and Brazilian Free-Form Modernism", de David Underwood; e as memórias de Niemeyer, "The Curves of Time".
O próprio fato de terem sido todos publicados em inglês e fora do Brasil dão a medida do reconhecimento internacional do legado de Niemeyer. Para Schwarz, a arquiteta e historiadora Philippou escreveu com autoridade sua avaliação sobre a obra do brasileiro e o lugar que ele ocupa na história da arquitetura e da cultura de seu país. Envolve temas tão distintos como a arquitetura colonial portuguesa do século 18, a bossa-nova, a topografia e a geografia cultural da praia de Copacabana.
A controvérsia e os debates
Longe de serem meras repetições de elogios, os livros e artigos também trazem de volta questionamentos, dúvidas e controvérsias. Tal debate, na verdade, sempre esteve presente na carreira do grande arquiteto brasileiro - como o compromisso político dele com mudanças sociais, que fez questão de manter a vida inteira, indiferente aos riscos pessoais e profissionais.
Ao analisar o livro de Philippou, Schwarz assinalou ter ela demonstrado serem "as realizações mais elevadas de Niemeyer profundamente informadas por uma estética brasileira, que fez das formas sinuosas um elemento básico de seu vocabulário - a exemplo da pavimentação em mosaico, alternando ondas pretas e brancas, tanto no período colonial como na Copacabana do início do século 20".
Outro destaque na análise meticulosa do livro, segundo a "Atlantic Monthly", é o que ela considera a primeira obra-prima de Niemeyer, o prédio do ministério da Educação, de 1943. Le Corbusier funcionou como um consultor da equipe de arquitetos brasileiros liderada por Niemeyer, que desenhou os elementos-chaves. "O mais belo prédio de governo no hemisfério ocidental", proclamou na época o MoMA de Nova York.
O início e as obras-primas
Segundo o livro, todas as obras-primas da fase inicial de Niemeyer - o Pavilhão do Brasil na Feira de Nova York (1939) e o Cassino da Pampulha, que casavam a precisão e clareza do Estilo Internacional com as linhas sinuosas, orgânicas; o prédio do Banco Boavista no Rio; sua casa nas Canoas - fundiram a graça austera com o estilo relaxado, freqüentemente lírico.
Tal enfoque culminaria, como observou Schwarz, nos três melhores "palácios" de Niemeyer em Brasília: a residência presidencial, o ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) e o Supremo Tribunal Federal. São prédios inspirados nas fazendas coloniais brasileiras (as amplas varandas sustentadas por colunas na casa grande das plantações), o que ajuda a explicar sua "grandeur" não intimidatória.
Phillippou os vê como monumentais e etéreos ao mesmo tempo. "Realizações imperecíveis", segundo a arquiteta e historiadora britânica. Mas ela não vê da mesma forma o resto da cidade. Muitos dos outros prédios esculturais, diz, parecem sem alma naqueles imensos campos pavimentados que oferecem poucos lugares para a pessoa sentar e pouca proteção sob o sol abrasador - a não ser as sombras dos próprios edifícios.
Brasília e os desdobramentos
A má reputação de Brasília, escreve o editor de "Atlantic Monthly", resulta em parte de sua história: apesar de construída por um governo progressista e mais ou menos democrático, tornou-se, quatro anos depois de concluída, a sede de um regime autoritário. E assim permaneceu por 21 anos. Obviamente, repetem-se no texto também as críticas habituais ao projeto urbanístico.
Seu planejador, Lúcio Costa, teria encontrado um cenário excessivamente vasto, fora de escala, como um oceano, com imensas nuvens movimentando-se acima. Nenhuma cidade inventada, segundo a autora do livro, seria capaz de acomodar-se naquela região inóspita. Costa procurou criar sua própria paisagem, não coerente com o meio-ambiente mas com teorias modernistas utópicas da racional e estéril "Cidade Radiante".
Schwarz observou ainda que, com Brasília, Niemeyer às vezes parece ter abraçado o pior aspecto do modernismo arquitetural - sua teoria urbana antissética. E no período pós-Brasília distanciou-se da graça e da lucidez nascidas da contenção. Os exemplos principais que aponta para comprová-lo são a Universidade de Constantine, na Argélia, e a Maison de la Culture, em Le Havre
Nenhum comentário:
Postar um comentário